Nesta semana, o post do blog nos leva ao topo das florestas tropicais, onde o autor Leonardo Ziccardi nos guia pelo mundo único das árvores anciãs da Amazônia, a partir do artigo “A coordenação de traços revela o espectro econômico rápido-lento das plantas ao longo do perfil vertical do dossel em florestas da Amazônia central”. Ao escalar o dossel e estudar a variação de traços entre espécies e camadas da floresta, Leonardo desvenda as interações complexas entre os microambientes da floresta e as estratégias de sobrevivência das plantas. O autor explica como as árvores emergentes da Amazônia são muito mais do que gigantes estáticas—elas são estrategistas dinâmicas.
1. Sobre o paper
Qual é o segredo das árvores antigas da Amazônia para sobreviver por tanto tempo até finalmente emergirem acima do dossel denso da floresta tropical? A resposta a essa pergunta é crucial para entender como as estratégias das árvores tropicais são moldadas por seu ambiente em constante mudança, oferecendo pistas sobre como as florestas tropicais responderão às pressões crescentes das mudanças climáticas. Realizando diversas campanhas de campo escalando árvores ancestrais gigantes sob o calor amazônico, exploramos como estratégias de aquisição de recursos “rápidas” e “lentas”—e os traços associados a elas—se distribuem ao longo do perfil vertical do dossel.
Nas florestas tropicais, as árvores competem por recursos e espaço em uma dimensão vertical que vai do escuro sub-bosque até o topo ensolarado do dossel. Em nosso estudo, investigamos como o funcionamento e crescimento das árvores mudam com a altura em espécies localmente dominantes em um dos sítios mais estudados na Amazônia. Descobrimos que a altura na floresta não só molda estratégias hidráulicas e traços foliares, mas também reorganiza como esses traços interagem para impulsionar o crescimento das árvores. Observamos que as árvores passam de uma estratégia aquisitiva (rápida) para mais conservadora (lenta) de aquisição de recursos à medida que se aproximam do topo do dossel. Em outras palavras, descobrimos que as estratégias adaptativas e o desempenho de árvores tropicais grandes mudam conforme sua posição vertical no dossel ao longo da vida, expandindo nossa compreensão sobre a resiliência das árvores e a dinâmica das florestas.
O impacto mais amplo do nosso estudo é uma nova compreensão sobre a variação vertical e as estratégias adaptativas que influenciam o crescimento das árvores em florestas tropicais. Essas descobertas vão muito além de uma floresta ou espécie específica: elas reforçam a necessidade de abordagens que consideram respostas em múltiplas escalas para prever como as florestas tropicais—cruciais para a regulação global de carbono e do clima—responderão às mudanças climáticas em curso. Ao quantificar a variação de traços hidráulicos e fotossintéticos-chave ao longo do perfil do dossel, nosso trabalho contribui para o aprimoramento dos modelos globais de vegetação e sua capacidade de prever produtividade, resiliência e respostas das florestas a cenários de mudança climática.
2. Sobre a pesquisa
Coletar os dados necessários para responder às nossas perguntas de pesquisa exigiu amostragem em diferentes alturas ao longo do dossel da floresta—uma tarefa que demanda muita determinação e coragem. Embora Leonardo estivesse motivado a se aprofundar nos estudos de ecologia do dossel, ele não tinha nenhuma experiência prévia com escalada em árvores—e, para dificultar ainda mais, tinha medo de altura. Inspirado pelos coautores que já haviam realizado pesquisas extensas no dossel, Leonardo e Kleber Campos (também coautor) foram ao Panamá para a realização de um curso especializado de acesso ao dossel. Lá, passaram 40 dias em treinamento intensivo com Griëtte van der Heide, renomada escaladora de árvores e pesquisadora. Munidos de novas habilidades e devidamente certificados, Leonardo e Kleber retornaram ao local de pesquisa próximo a Santarém (Pará, Brasil), ampliaram a equipe e iniciaram sua jornada.
Navegar pela altura e complexidade do dossel amazônico trouxe muitos desafios diários—desde chuvas intensas e insetos persistentes até dias escaldantes suspensos nas copas das árvores. Planejamento cauteloso, protocolos de segurança e colaboração com a comunidade local foram essenciais para minimizar riscos e garantir o sucesso. Ao longo de extensas campanhas de campo realizadas em 2019 e 2021, nossa equipe desbravou as gigantes árvores ancestrais da Floresta Nacional do Tapajós, no coração da Amazônia, amostrando quase 500 folhas de 162 galhos ao longo do perfil vertical da floresta. Nossas jornadas pelo dossel revelaram um mundo de estratégias secretas que auxiliam na resiliência de árvores anciãs. Olhando para trás, houveram muitos momentos difíceis e ocasiões em que todos estávamos exaustos do trabalho intenso de campo. Mas os desafios valeram a pena: as dificuldades ficaram às sombras das descobertas, e a jornada foi tanto cientificamente como espiritualmente inesquecível.
Todo o esforço e perseverança nos levaram a uma descoberta surpreendente. Constatamos que as árvores antigas do dossel amazônico são muito mais do que gigantes estáticas—elas são estrategistas dinâmicas, adaptando-se continuamente à medida que as condições mudam em direção ao dossel da floresta. Uma de suas maiores fortalezas é a incrível capacidade de ajustar estratégias em resposta ao ambiente diverso e em constante mudança do dossel conforme envelhecem. Esperamos que futuros estudos aprofundem nossos achados explorando esses padrões em outros ambientes hidrológicos e diferentes estações. Um próximo passo natural seria investigar a variação vertical das respostas das árvores às condições de seca, assim como ampliar o trabalho de campo para a estação chuvosa—quando acessar o dossel se torna um desafio ainda maior devido às constantes tempestades.
Leonardo foi financiado pela prestigiada bolsa Future Investigators in NASA Earth and Space Science and Technology (FINESST), concedida pelo programa Early Career Research da divisão de Ciências Terrestres da NASA. Esta pesquisa também foi apoiada pela National Science Foundation Division of Environmental Biology (NSF DEB). Esses financiamentos, juntamente com o apoio logístico do LBA (Large-Scale Biosphere-Atmosphere Experiment in Amazonia), foram essenciais para tornar essa pesquisa possível.
3. Sobre o autor
Fora da pesquisa, eu sou apaixonado por música, skate e arte—seguindo os passos da minha mãe, uma talentosa pintora. Eu nasci e cresci em São Paulo, uma grande metrópole com mais de 12 milhões de habitantes. Apesar—ou talvez até por causa—da minha origem urbana, sempre fui profundamente fascinado e curioso sobre a natureza—especialmente pela floresta amazônica, que acabou me inspirando a seguir carreira em ciências florestais e pesquisa. Minha trajetória científica começou na graduação em Engenharia Florestal na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Brasil. Minhas primeiras pesquisas sobre índices de risco de incêndios florestais me mostraram que, ao dominar ferramentas estatísticas e formular boas perguntas, é possível propor soluções práticas para a sociedade. Mais tarde, durante o mestrado no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), minha pesquisa sobre os efeitos de distúrbios antropogênicos em florestas dominadas por bambu com o Dr. Philip Fearnside me apresentou aos desafios e ao entusiasmo de fazer descobertas importantes na Amazônia.
Atualmente, sou aluno de doutorado em ciências florestais na Michigan State University. Compartilhando interesses com meu orientador, Dr. Scott Stark, eu me aprofundei no universo da pesquisa no dossel—superando meus próprios limites para entender como folhas, árvores e copas respondem às mudanças ambientais. Sinto-me incrivelmente privilegiado por ter a oportunidade de navegar pelo topo das florestas amazônicas—um dos lugares menos explorados e mais fascinantes do planeta. Estou fortemente motivado a continuar desenvolvendo conhecimento e soluções para ajudar a mitigar os possíveis efeitos catastróficos das mudanças climáticas já em curso—um desafio global no qual as florestas tropicais desempenham papel fundamental na regulação do clima futuro do planeta.
Como muitos cientistas em início de carreira, enfrentei barreiras como financiamentos limitados, trabalho de campo exaustivo e momentos de dúvida—desafios que me fortaleceram e proporcionaram resiliência. Se pudesse dar um conselho ao meu Eu mais jovem, seria: Confie no processo; o que quer que aconteça como consequência de abraçar seu propósito é o melhor que pode acontecer.
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